Criança, mãe da criança e madrasta-boa
O meu filho tem uma
madrasta, não uma Madrasta, mas uma Madrasta-Boa. É desta forma que se autointitula
e faz juz ao nome! Conheço poucas pessoas na minha situação de divorciada e com
filhos, e com a boa relação que existe entre mãe da criança, pai e Madrasta-Boa
(e família). O caso é de exemplo fácil: Egos para baixo e Bandeira “Filho”
sempre hasteada. Hoje foi mais um dia em que, a sociedade conservadora, mas com
esperança na justiça dos povos e no amor, ficou mais uma vez incrédula,
inquieta e a morder nas costas de alguém porque a figura da Madrasta apareceu na vida real! O cenário envolve a situação do dia em que deixei de ter vontade que a minha médica de família conhecesse o meu filho. Depois
desse episódio pensámos mudá-lo de centro de saúde, desta vez para o do
agregado familiar do pai. E hoje, finalmente conheceu a sua nova médica de
família, de bom aspecto, atenciosa, jovem e disponível. Dirigimo-nos, mãe da
criança, criança e madrasta-boa, à respectiva recepção do centro. A
senhora que nos atendeu não primava pela simpatia, mas era melhor do que o que
eu estava habituada no meu centro de saúde. Explicámos que queríamos inscrever ali a
criança, uma vez que a madrasta-boa e o pai são utentes do centro e que já tinham
falado com a médica. A recepcionista diz que isso só pode ser feito na presença
da mãe – prontamente sou apresentada pela madrasta-boa - e a senhora olha
desconfiada. Apresentámos os três cartões de cidadão (mãe, pai e filho) mas
mesmo assim a recepcionista continuou desconfiada. Pousou os cartões e ligou à
médica. Nós escutamos que ela, entre-dentes, disse à Doutora que já tiveram
inúmeros problemas destes. Ficámos de sobrancelhas franzidas e testas
enrugadas... (problemas? como? mas isto é caso de problema?). Desligada a
chamada pede para aguardarmos que a Doutora irá receber-nos (hum? o quê? mas há
de facto algum problema?). A Doutora, com um sorriso incomodado, manda-nos entrar. Pede à madrasta-boa para relembrar a história e a mim
para explicar a razão da mudança. Questiona-me também se eu faço parte ou, se
pretendo vir a fazer parte daquele centro de saúde, ao qual respondo afirmativamente (mas só por acaso, só porque quero ir morar para aquela área de
residência). A Doutora explica-nos que, por lei, quando existe uma separação
dos pais, os cuidados de saúde das crianças ficam entregues às mães (e aqui eu
começo a rever mentalmente todas as situações que conheço de divórcios com
filhos e de mães que o são e não deveriam ser, bem como de pais que o são e
também não deveriam ser... uma “visita de médico” e dá para colocarmos um
rótulo na nossa lei “obsoleta”). Mas para resolver a nossa questão é simples,
basta fazermos uma declaração na secretaria a dizer que queremos que a criança
fique aos cuidados de saúde do agregado familiar do pai. E assim foi. Após a declaração
feita, pedimos para falar com a enfermeira por causa da marcação das vacinas
(aquelas que a médica de família dos Olivais alegou estarem em atraso, apesar
de serem entre os 5 e os 6 anos). A enfermeira (jovem , disponível e atenciosa)
vem ao nosso encontro e começou a falar para nós as duas, à sua frente.
Caiu-lhe a “beleza” quando se lembra de perguntar qual de nós é a mãe – respondemos
e acrescentámos que poderia falar para as duas – e a partir desse momento,
olhar e falar exclusivamente para mim. Tudo o que disse foi impecável,
inclusive que sim, que as vacinas são entre
os 5 e os 6 anos, portanto, até fazer os seis está dentro da “legalidade”,
bastava ter feito cair os preconceitos e teria sido uma mulher e peras. Ouvimos
todas as instruções, que especificavam bem que a mãe deverá ligar para marcar
as vacinas, e não, qualquer uma de nós. À saída a madrasta-boa dizia “Sou mesmo
Alien, aliás, somos mesmo Alien’s”. E é verdade que infelizmente ainda o somos.
A sociedade que vive as hastear bandeiras de Amor, que fica chocada com a
brincadeira com os pobrezinhos, que se pudesse contratava um paparazzi para ter
em casa à disposição, não consegue hastear uma bandeira de Felicidade perante
uma situação diferente e mas exemplar. Para nós é fácil, a nossa bandeira-Filho
está lá em cima e todos queremos vê-la bonita, a colorir os céus e as nossas
vidas. Para nós é fácil, porque sempre soubemos que em primeiro lugar está o
nosso filho e enteado. Para nós é fácil, porque deixamos de olhar para o nosso
umbigo. Para nós é fácil, porque ninguém ousa “usar” aquele ser como arma de
remesso. Não é fácil deixarmos de pensar com o Ego, mas fizemo-lo mais
facilmente porque, acima de tudo, respeitamos aquele Ser enquanto Pessoa. E desenganem-se
quem pensa que foi uma sorte nossa. A sorte dá muito trabalho. Muito! Mas mesmo
enquanto dá trabalho é sempre a pensar na felicidade que tivemos e temos, em
poder estar com um Ser tão especial como aquela criança. É muito bom viver
feliz com um, dois, três, quatro... ter uma Madrasta-Boa, uma Bodrasta, um
Padrasto, um Vô-Dastro, uma Vó-Dastra, pai, mãe, avós, tios, primos, madrinhas
e padrinhos, quando todos eles erguem verdadeiramente a bandeira do Amor.
Comentários para quê?? Xi-coração, mãe e madrastra boa.
ResponderEliminarObrigada à mãe da criança por me entender como madrasta boa! Ser madrasta desta criança é a maior honra que posso ter e, sim, é com orgulho que sou madrasta desta criança que me abraça como parte importante da sua vida. Sempre!
ResponderEliminarInfelizmente histórias como a do centro de saúde (que não ficou por ali!) vivo-as constantemente, mas esta criança vale todas elas. É a naturalidade com que ele próprio informa os outros "é a minha madrasta boa" que muitas vezes faz cair todo e qualquer preconceito que julga a nossa relação.
Dá trabalho, dá! Mas para que tudo seja fácil e as transições tranquilas. É uma criança muito feliz e isso é que é importante! Para qualquer alien!