24 de Dezembro ... o que era, o que é
24 de Dezembro, 2014
Naquele tempo eram 2 avós, 6 filhos, 6 genros e nora, 9
netos. Vinte e três pessoas certas à mesa e mais umas quantas flutuantes,
consoante a maré dos namoros. A chegada à casa era feita a conta-gotas.
Primeiro chegavam os que vinham de longe e depois começavam a aproximar-se os
que moravam ali perto.
Uma casa branca, no meio de um pinhal. Uma chaminé a fumegar
de manhã à noite. Uma mesa corrida cheia de tachos e panelas. Bancos corridos
feitos com tábuas quando as cadeiras faltavam. Alguidares tapados onde
levedavam as massas. Enfeites do pinheiro, e da casa, a cargo dos netos.
Prendas, devidamente identificadas, colocadas na sua base. Mulheres na cozinha,
homens na adega. À ceia, tal como na Noite de Natal da Sophia, os copos de
cristal também saíam do armário. Um louceiro azul claro com puxadores de metal.
Os pratos eram de motivos diversos, uns com pássaros desenhados (e os netos
preferiam sempre estes) e outros com o Papa João Paulo II. Todos os anos a
ementa era a mesma mas era sempre como se a provássemos pela primeira vez.
Caras de bacalhau, batatas cozidas, couves e muitas sobremesas. Finda a
refeição enquanto umas mulheres lavavam a loiça com a água aquecida na lareira,
outras juntavam-se ao lume para fritar as massas já levadadas. Entretanto, o
café de cevada era aquecido nas brasas em grandes cafeteiras. O cheiro da casa
andava entre o fumo, o café e os fritos, colando-se à roupa escolhida a dedo
para a cerimónia. As crianças, após a ceia, saíam de casa para que os nervos
não dessem cabo das prendas, nem da tranquilidade dos adultos. Saíam de casa e
quase sempre íam jogar às escondidas, numa noite escura mas estrelada. Tudo era
esconderijo, as couves da fazenda do vizinho, os pinheiros e sobreiros do
pinhal, os carros estacionados. Havia quem se aventurasse a ir mais longe e
saía com as “pasteleiras” dos avós para uma volta maior. Findos os trabalhos de
casa, era dada autorização a duas crianças para distribuírem os presentes. Para
mim, como só aquela festa fazia sentido, transportava os presentes que tinha
recebido em minha casa, para casa dos avós. A festa era aquela. Onde a
cerimónia era levada a sério, onde toda a família se juntava em casa dos mais
velhos. Quando soavam as doze badaladas o mais velho, Mário, lançava os seus
foguetes. Naquele momento nascíamos todos de novo. A festa era sempre a mesma,
mas era sempre a primeira vez.
Neste tempo de agora são 10 avós, 8 filhos, 1 genro e 15
netos. A mesa já não é corrida. Foi dividida em várias partes e levada por cada
um para sua casa. A cerimónia ficou na memória e na saudade.
Agora, na nossa parte, somos dois avós, uma filha e um neto. Os rituais mantém-se, excepto as
escondidas no pinhal e o lançamento dos foguetes. Hoje deixamos velas acesas durante
a noite. Somos felizes assim e sabemos o quanto somos sortudos por permaceremos
juntos, mas falta cá gente, cheiros e barulhos. Talvez o que nos falte cá em
baixo, seja aquela Luz da Memória que nos ilumina cada vez com mais intensidade.
Lindo e emocionante, como sempre! Volta sempre também por aqui!!!
ResponderEliminarQue bom saber-te também por aqui !!! Até já! Obrigada, amiga!
EliminarVi tudo, amiga, e mais além... a cara do vizinho depois das escondidas... imaginei o sorriso triunfante da Rita a chegar com as suas prendas... Vi, cheirei, senti o calor.
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