Até que a voz me doa...
Boa voz ou uma voz radiofónica nunca foi a minha especialidade. Tenho uma voz que escorrega nos "s", por causa dos anos seguidos com aparelhos dentários. Uma voz que foi chumbada à entrada do curso de Terapia da Fala. Uma voz normal (com o que a normalidade tem de mau). No entanto, passei anos a fio a tentar ter uma voz "especial", ou seja, enrouquecida. Nos tempos de infância e juventude, com os amigos, cantávamos, berrávamos até à exaustão. Dias e dias seguidos a cantar, cantar, cantar. O que é certo é que a grande maioria dos amigos ficava rouco passado umas horas, e eu, para mal do meu desejo, nada. Não me lembro de alguma vez ter ficado rouca de tanto cantar, gritar, esganiçar, falar... Tinha esse desejo, ficar rouca. Achava um charme. Por certo era influenciada pelos grandes artista da berra, um Brian Adams ou um Sting que tinham e têm ali qualquer coisinha rouca na voz. Desta época da voz rouca nunca me esqueço de uma grande amiga, a Mitó (vocalista dos Naifa), que cantava lindamente, com uma voz poderosa, mas que ao fim de dois dias se deixava de ouvir. E eu... vai de cantar, rouxinol! A Mitó tratou e trata muito bem da sua voz, pelo menos tendo em conta o seu sucesso. Eu fiquei com uma voz que não se cala profissionalmente, que é utilizada para passar o testemunho das histórias, dos poemas, dos programas escolares. É uma outra espécie de rouxinol. Aproveito-me das histórias e falo, falo, falo... até que a voz me doa! (que não pode ser amanhã com os cerca de quinhentos meninos que vou ter à minha frente!).
Uma voz especial é um excelente cartão de visita à alma. Elas existem, e andam por aí a encher balões de ar quente. Mas qualquer voz devia ser vizinha da palavra certa. Isso era o ideal. Uma voz cheia de palavras soltas não enche o peito de ar. Uma voz com poucas palavras, escolhidas e ditas no timbre certo, fazem encher o peito e a alma.
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